domingo, 29 de março de 2009

As múltiplas interpretações sobre a violência

(Livro lançado em 2004, Coord. Gey Espinheira,no qual participo com o artigo Juventude e violência).

SOCIABILIDADE E VIOLÊNCIA

A violência: os conceitos de violências têm sido propostos para falar de muitas práticas, hábitos e disciplinas, de tal modo que todo comportamento social poderia ser visto como violento, inclusive o baseado nas práticas educativas, tais como na idéia de violência simbólica proposta por Pierre Bourdieu (2001). Para esse autor, a violência simbólica se realiza sem que seja percebida como violência, pois se insere em tramas de relações de poder naturalizadas. Como um fenômeno contingente a violência é socialmente produzida, pluricausal, multifatorial, uma ação que agride, maltrata e brutaliza a espécie humana, negando a política e a convivência social; a violência pode também ser compreendida como todo ato que implica na ruptura de um nexo social pelo uso da força.
As condições materiais de existência não são necessariamente as causas da violência, mas fatores contribuintes de elevado peso, na medida em que em locais e entre jovens de média e alta renda comportamentos violentos e formas de violência assemelhadas são registrados; mas, entre os jovens dos bairros populares estão os maiores índices de homicídios, sejam os executados por grupos de extermínio ou aqueles que resultam de enfrentamentos de galeras e gangues em defesa e em conquista de territórios bem demarcados de atuação de traficantes de drogas ou de localização de grupos marginais organizados, também ou difusos, praticantes autônomos de furtos, roubos e assaltos; por fim, a banalização da morte como solução para conflitos.
O teorema de Thomas nos diz que “se os indivíduos definem as situações como reais, elas são reais em suas conseqüências”. Assim, configurando a realidade da vida cotidiana como um campo de conflitos que devem ser pessoalmente resolvidos, os jovens, mas também os adultos banalizam a violência e a transformam em meios efetivos de resolução de problemas.
FATORES: Diversos fatores influenciam o ingresso de jovens no mundo da violência e do crime, entre estes: a pobreza; as dificuldades de inserção no mercado de trabalho; a ausência da família; o desestimulo gerado pela instituição escolar; a falta de perspectivas; a cartelização expansiva da delinqüência e da droga; a impunidade e a perda de confiança na efetividade do sistema jurídico. Fatores que correlacionadas geram o bloqueio que se instaura em um contexto social opressor e de múltiplas carências. Os jovens nestes contextos de vulnerabilidade são capturados e lhe são impostos códigos de escolhas criados por um mundo que para Zygmunt Bauman (2000, p.26), “fabrica incertezas, inseguranças e falta de garantias; viver na incerteza revela-se um estilo de vida, o único estilo de vida possível, como tendência de uma ‘corrosiva desesperança existencial’”.
Incerteza, medo e risco, são situações presentes na vida dos jovens pobres das cidades brasileiras, especificamente, os que residem em bairros periféricos e precarizados pela ausência do poder estatal. Jovens que vivem em um contexto hostil de múltiplas carências e reincidentes fracassos, e que na luta pela sobrevivência são vulnerabilizados a encontrar como alternativa o investimento em práticas transgressoras, que repetidas se constituem em uma cultura de violência, dinamizada cotidianamente por um quadro de despossessões e pobreza. O jovem pobre é figurado como um “despossuido” de direitos de razões, e de suas próprias expectativas de futuro, ele faz parte de uma parcela da população que tem seu cotidiano marcado por diversas privações e angústias. A desqualificação social que chega a estes jovens são rebatimentos manifestos da perversa lógica do capital, que exacerba a exclusão e aumenta o negligenciamento da cidadania efetiva.
A juventude como uma etapa da vida em que os indivíduos deveriam ser preparados a assumir o papel dos adultos na sociedade, consolidando sua integridade moral e critica é negada. O jovem é privado de oportunidades para obter está preparação e se torna um adulto desprovido de condições instrumentais e cognitivas para se compreender e se fazer presente no mundo como um sujeito transformador. Tal situação que se reproduz em um ciclo de determinações e bloqueios faz parte da vida de milhares de jovens pobres.
Há um grande número de jovens que vivem um cotidiano dramático de privações, de humilhações e agressões, e que têm em mente “descontar” os constrangimentos a que são submetidos; outros tantos avaliam que “não tem nada a perder” e se predispõem a ações de risco como única alternativa possível para realizar seus objetivos. [...] Assim, impedidos de trabalhar, pois o sistema produtivo não oferece a chance do primeiro emprego – e isso se agrava com a precariedade da formação educacional, estes jovens se entregam a um ócio improdutivo e voluptuoso, no qual a presença de substâncias psicoativas é freqüente e em seguida se iniciam em práticas transgressoras como única saída para a obtenção de recursos.


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